Budapest Honvéd 1950-1956

POUCAS VEZES NA HISTÓRIA do futebol um clube esteve tão entrelaçado ao destino de uma seleção nacional quanto o Honvéd esteve à Hungria dos anos 1950. A base tática, os craques e até a filosofia de jogo que encantaram o mundo na Copa de 1954 foram forjados no cotidiano desse time — cuja trajetória, embora breve, permanece como uma das mais impactantes do século XX.

Hónved 1950

Em pé: Budai II, Lóránt, Városi, Bányai, Babolcsay, Boszik; Agachados: Kocsis, Puskas, Rákóczi, Budai I, Grosics

Time: Budapest Honvéd

Período: 1950-56

Time base: Grosics; Rákóczi, Lorant, Kovács; Bányai, Bozsik; Budai, Puskas, Balbocsay, Czibor; Kocsis. Téc. Ferenc Puskas I e Jeno Kalmar.

Conquistas: Pentacampeonato húngaro

Um estilo à frente do tempo

O Budapest Honvéd tem muitas histórias para contar. Nos tempos que se seguiram ao Caso Bosman, tornou-se inimaginável uma grande equipe vinda da Hungria; e, mais estranho do que isso, um time que atuava variando por sobre um esquema tático próximo de um 3-2-5, ou 3-2-2-3, segundo se conta. Aquilo era a evolução do famoso W-M para um dito M-M.

Na prática, isso queria dizer que o centroavante, com frequência, recuava para compor a linha de meio-campistas, encontrando espaços que até então ninguém ousara desbravar. Muito do que acontecia no Honvéd era reproduzido pela seleção húngara, e vice-versa.

Como reporta Mauro Beting, em As melhores seleções estrangeiras de todos os tempos, o grande craque daquele time e do país, Ferenc Puskas, explicou um pouco do que se via: “Nosso time jogava bem demais sem a bola. E o centroavante recuado foi nossa obra-prima”.

O Honvéd era tão brilhante que parte de seus jogadores ainda fez sucesso em grandes centros. Isso ficou especialmente evidente na figura de Puskas, que se tornaria ídolo eterno do Real Madrid, vindo, inclusive, a representar a seleção espanhola. As memórias contam a história de um atleta comparável a lendas como Pelé, Diego Maradona e Alfredo Di Stéfano.

O projeto do Estado

A equipe, que até a década de 1950 tinha pequeno porte, foi escolhida pelo governo comunista para afirmar sua força, no âmbito esportivo, perante a nação e o continente.

Até então, chamava-se Kispesti e possuía dois atletas talentosíssimos que, sozinhos, garantiam-lhe apenas modestas colocações no campeonato local: Joszef Bozsik e Puskas, que além de tudo eram vizinhos e amigos de infância. Só isso. A mão do Estado ainda permitiu a contratação de uma legião de craques eternizada sob o nome de Hónved (“Defensores da Pátria”, em tradução livre).

Nomes inesquecíveis

Grosics Honved

Foto: Reprodução

No gol, atuou um goleiro lendário: Gyula Grosics, o “Pantera Negra”. O famoso arqueiro fez 86 jogos pela seleção e 125 pelo Honvéd. Defendeu a meta do clube entre 1950 e 57; conquistou o ouro olímpico em 1952; e disputou as Copas de 1954, 1958 e 1962. Além disso, foi eleito o melhor goleiro da Copa de 1954. Ele foi um dos destaques da equipe que nunca deixou seu país.

A retaguarda poderia ser descrita por vários prismas. Não seria errado dizê-la composta por três quanto por quatro, ou cinco, integrantes. Não havia uma linha fixa consolidada.

Defensores, a rigor, eram apenas Kovács, Lorrant e Rákóczi. A eles, uniam-se, um pouco mais adiantados, Bányai e Bozsik. Este foi o atleta que mais atuou pela equipe rubro-negra em toda história, tendo o estádio da equipe sido, postumamente, batizado em sua homenagem. Ele era o principal meio-campista, o esteio coletivo. Um jogador recordado pela técnica, a liderança e a capacidade para gerir o jogo.

Boszik Honved

Foto: Reprodução

No ataque, havia uma constelação de craques. László Budai, Balbocsay, Zoltán Czibor e Sándor Kocsis. Budai era um ponta direita eficiente. Talentoso mesmo era o ponta-esquerda Czibor: além de ter marcado época no futebol húngaro, veio a alcançar grande destaque também no Barcelona, clube em que marcou 63 gols em 93 jogos.

Mais à frente, postava-se Kocsis. O jogador conseguiu uma impressionante média de mais de um gol por partida no Budapeste Honvéd. Foram 153 tentos em 145 encontros. Depois, seguindo o exemplo de Czibor, fez carreira na capital da Catalunha. Também envergando o manto azul e grená do Barça, marcou 140 gols, em 194 partidas.

Ferenc Puskas, o mito

Acima de todos, figurava a estrela maior: Puskas. Ferenc Purczeld Biró é um futebolista que merece um capítulo próprio. Maior jogador da história da equipe e do futebol húngaro, e um dos melhores de todos os tempos, o craque jogou 12 anos no Budapeste Honvéd e marcou 352 gols pelo clube, em 341 jogos. Depois, rumou para o Real Madrid.

Foram mais oito anos e uma coleção absurda de troféus, com destaque para o tricampeonato da Copa dos Campeões da Europa e o pentacampeonato espanhol. Pela seleção magiar, foram 84 gols em 85 jogos. Trata-se de uma entidade mitológica do futebol, segundo Beting:

“Pioneiro no desenvolvimento de uma central de comunicação em campo de futebol que interligava vários pontos e atletas como se fosse por telepatia, deixando os rivais ocupados, confusos com aquele emaranhado que resultava numa mensagem perfeita. Ferenc foi gênio porque nasceu sabendo”.

Puskas Honved

Foto: Reprodução

Apesar de todo esse sucesso, com a Revolução Húngara, em 1956, o esquadrão se desfez.

O fim do sonho

O país vinha sendo governado com mãos fortes desde 1948, pouco tempo após o fim da Segunda Guerra Mundial. A resposta do povo demorou, mas veio. E foi fortemente reprimida, dando lugar a um governo ainda mais repressor, ao menos em um primeiro momento.

No momento desse evento, o clube jogava as oitavas de final da Copa dos Campeões, atual Liga dos Campeões, contra o Athletic Bilbao. Já havia sido disputado o jogo de ida, com vitória basca. Mas, com a notícia do levante popular, a decisão foi levada para Bruxelas, ante a falta de condições da capital húngara.

Um empate por 3 a 3 não foi suficiente para classificar os húngaros. E parte deles decidiu se exilar, temendo a vida em um país que se via em meio a uma intervenção militar. Craques como Puskas, Kocsis e Czibor deixaram o clube. E, após um banimento de alguns meses, surgiram com as camisas dos famosos times espanhóis. Foi o fim da incrível e curta história de uma equipe nada menos que épica.

 

Partidas importantes no período

Budapest Honvéd 3 x 3 Athletic Bilbao

Heysel Stadium, Bruxelas-BEL

Público: 30.000

Árbitro: Albert Alsteen (BEL)

Gols: Budai 6’ e 82’, Puskas 86’ (Budapeste Honvéd) e Merodio 1’ e 72’, Arieta 67’ (Atlético de Bilbao)

Budapest Honvéd: Lajos Faragó; László Rákóczi, Nándor Bányai, Zoltán Dudás; József Bozsik, Antal Kotász; László Budai, Sándor Kocsis, Ferenc Machos, Ferenc Puskas, Zoltán Czibor. Téc: Jenö Kalmár

Athletic: Carmelo Cedrún Ochandategui; José María Orué Aranguren, Jesús Garay Vicino, Nicanor Trapero Gonzalo “CANITO”; Mauricio Ugartemendía Lauririca “MAURI”, José María Magureci Ibarguchi; José Luis Arteche Muguire, Félix Marcaida Aurrecoechea, Ignacio Arieta Araunbeña Piedra, Armando Merodio Pesquera, Agustín Gaínza Vicandi. Téc: Fernando Daučik

Wladimir Dias

Idealizador d'O Futebólogo. Advogado, pós-graduado em Jornalismo Esportivo e Escrita Criativa. Mestre em Ciências da Comunicação. Colaborou com Doentes por Futebol, Chelsea Brasil, Bundesliga Brasil, ESPN FC, These Football Times, revistas Corner e Placar. Fundou a Revista Relvado.

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