O resgate do Porto por Sérgio Conceição

Um dos mais destacados jogadores
portugueses de sua geração, de um tempo em que figuraram ícones como Luís Figo
ou Rui Costa, Sérgio Conceição tomou o caminho dos bancos de reservas quando
viu sua carreira de futebolista se encerrar. Depois de passar por equipes como
a Académica, de Coimbra, e os rivais do Minho, Braga e Vitória de Guimarães, o
treinador marcou sua trajetória com um grande trabalho de seis meses no Nantes.
Na oportunidade, herdou um time próximo da zona de rebaixamento e o entregou
apenas uma posição atrás da zona de classificação à Europa League. Assim
recebeu a chance de sua vida: tentando fugir da sombra do Benfica, atual
tetracampeão português, o Porto, clube que projetou Conceição enquanto atleta
no cenário internacional, entregou-lhe a missão de fazer ressurgir os Dragões.
Sérgio Conceição Porto

Início quase perfeito

Desde que Sérgio Conceição voltou
a Porto, o torcedor não tem tido do que se queixar. Já transcorreram 10 rodadas
do Campeonato Português e outras quatro da UEFA Champions League – além
de partidas das copas locais. O desempenho do time dificilmente poderia ter
sido melhor. Ainda que os Dragões tenham
vendido seu mais valorizado jogador, André Silva, deixando partir também o
promissor Rúben Neves e sem fazer grandes investimentos, o clube tem conseguido
se reerguer. Na prática, os reforços acabaram por ser peças que retornaram de
empréstimo.
O primeiro trabalho de Conceição
foi convencer o atacante Vincent Aboubakar, vindo de ótima temporada cedido ao
Besiktas (36J e 18G), a retornar ao Estádio do Dragão. Conseguiu e de plano
conquistou um substituto para André. “Quem me motivou a vir foi o novo
treinador, que me telefonou, incentivou-me, mostrou que queria muito contar
comigo […] Na verdade, não mudamos só de treinador, mudamos muitas outras
coisas”, disse o camaronês no início de outubro ao Record.
Moussa Marega Aboubakar Porto
Além do goleador, que já registra
11 tentos em seus primeiros 13 encontros nesse retorno, Sérgio Conceição
recebeu retornados os atacantes Hernâni e Moussa Marega, ambos de boa campanha com o Vitória de Guimarães na última temporada (quarto lugar, chegando à Europa
League). Voltaram também os amadurecidos zagueiro e volante Diego Reyes, do
Espanyol, o lateral direito Ricardo Pereira, um dos destaques do Nice nas
últimas duas temporadas, e o meio-campista Sérgio Oliveira – comandado por
Conceição no Nantes em 2016/17.

Marega e Ricardo têm sido
titulares e com muito destaque. O atacante malinês registra oito gols em 14
jogos e o lateral português, que disputa posição com o uruguaio Maxi Pereira,
tem duas assistências em 10 encontros. Outrora dispensáveis, sob a batuta do
novo treinador e velho conhecido da torcida portista, algumas figuras
renasceram.

Com elas, ressurge também o Porto.
O início no Campeonato Português é quase perfeito. Em 10 rodadas, tem nove
vitórias e um empate contra o rival e concorrente direto Sporting CP (fora de
casa). Tem o melhor ataque (28 gols marcados) e a defesa menos vazada (quatro
sofridos).  Na Champions, foi sorteado
para um grupo equilibradíssimo. Dividindo-o com Besiktas, RB Leipzig e Monaco,
vem obtendo destaque. Em quatro jogos, tem duas vitórias e duas derrotas.
Perdeu em casa para os turcos e fora para os alemães. Na contramão, engoliu o
Monaco no Principado, impositivo 3 a 0, e se bateu Leipzig em casa, 3 a 1.
Tem todas as possibilidades de avançar às oitavas de finais.

Consolidação de alguns jogadores

Além de recuperar alguns atletas
outrora “dispensáveis”, Sérgio Conceição vem conseguindo extrair o melhor de
outras figuras que já estavam no elenco e que muitas vezes foram criticadas por
apresentar alguma inconsistência em suas exibições. Talento à parte, Yacine
Brahimi e Jesús Corona, por exemplo, nunca foram jogadores em quem se pôde
confiar para decidir jogos em momentos difíceis. Além disso, careciam da
capacidade de entregar melhor contribuição na fase defensiva.
Yacine Brahimi PortoHoje, muitas vezes o Porto tem
atuado no esquema tático 4-4-2, com Aboubakar e Marega isolados. Assim, tem
vindo a ser fundamental a capacidade de Brahimi e Corona de fechar a segunda
linha de quatro homens quando o time é atacado. Na esquerda, o argelino tem se
associado muito bem com Alex Telles; na direita, o mexicano tem feito o mesmo
com Ricardo. É possível provar isso: Brahimi tem média de 1,2 desarmes por jogo
no Campeonato Português e 2,3 na UEFA Champions League; Corona 2,3 e 1,5,
respectivamente.

“Às vezes as pessoas pensam que ter mais um meio-campista é melhor para
o equilíbrio da equipe, mas importante é a ocupação dos espaços”
, disse o treinador
em entrevista coletiva após a vitória frente ao RB Leipzig.

Para se ter ideia do que isso
representa, o principal volante da equipe e, possivelmente, seu jogador mais
importante, Danilo Pereira, apresenta médias de 2,2 em solo doméstico e 2,8 na
competição continental. Se tal desempenho não é novidade, o de Héctor Herrera,
o novo capitão do time, é. Depois de começar a temporada no banco de reservas,
ressurgiu e assumiu protagonismo. Dinâmico, assumiu lugar ao lado de Danilo,
fazendo um double pivote. De reserva
à capitão, foi o responsável, inclusive, por abrir o placar na partida de volta
contra o Leipzig.
Mais atrás, Felipe e Iván Marcano seguem a mesma toada da temporada passada, seguros. Sérgio Conceição conseguiu,
todavia, fazer com que, coletivamente, o escrete portista atue de forma mais
compacta, com saída em velocidade pelos flancos e profundidade a partir do uso
de dois atacantes de ofício, mas com velocidade o suficiente para acompanhar o
ritmo do time e pressionar a saída de bola dos adversários.

Superando polêmica no gol

José Sá PortoOutra missão dura que vem sendo
enfrentada nas últimas rodadas por Sérgio Conceição, e que tem gerado polêmica,
é a troca feita na defesa da meta dos Dragões.

O experiente Iker Casillas deu lugar ao jovem português José Sá, de extenso
currículo nas equipes de base da seleção de seu país. A imprensa, quase em coro
único, tem entendido que o espanhol vive bom momento e que o lusitano ainda não
está em seu nível. No entanto, o treinador garantiu que a mudança se tratou de
questão técnica e tem sustentado a opção. Enquanto os resultados seguem vindo,
tem sido difícil apontar dedos à alternativa escolhida.

Parte da imprensa local disse que a troca adveio de
problema disciplinar de Iker, o que Sérgio também negou com veemência: “o
Casillas tem tido um comportamento irrepreensível. Escreveu-se que era um
problema disciplinar? Isso é ridículo. Se fosse um problema disciplinar, ele
nem estava nos convocados”, revelou antes do encontro frente ao Paços de
Ferreira.

Com resultados e consistência
dentro das quatro linhas, Sérgio Conceição vai dominando seu elenco, fazendo o
torcedor portista sonhar com o fim da hegemonia do Benfica e com títulos –
mesmo porque os Encarnados não têm
tido uma temporada fácil. Como tudo em Portugal se centra ao que ocorre em
torno do trio de potências, quando se fala de futebol, sempre nascem polêmicas, como a
da escolha do arqueiro titular dos Dragões.
No entanto, enquanto as vitórias seguirem sendo obtidas, não se torna útil a discussão
acerca de problemas internos, pois mesmo que existam (e, repise-se, não há
muitos indícios nesse sentido) a consciência coletiva de um compromisso com os resultados tem sido mais forte.

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