O curioso caso do treinador Frank Rijkaard

O Barcelona treinado por Pep
Guardiola ficou consagrado como um dos melhores times de todos os tempos. Além
do belo futebol coletivo praticado e da excepcional individualidade de algumas
peças, aquele Barça tinha uma identidade, o que o tornou único e lhe rendeu um
lugar na lista dos maiores. No entanto, Pep encontrou o clube em uma situação
estável, muito diferente da vista no início deste século. Uma das razões, sem
dúvidas, foi o bom trabalho de Frank Rijkaard, comandante, que, no entanto, não obteve sucesso após seu longo período como treinador do clube catalão.

Quando chegou ao Camp Nou, em
2003, Rijkaard tinha uma missão clara: tirar o Barça de uma crescente
involução. Há quatro temporadas o clube catalão não conquistava o Campeonato
Espanhol, vendo Deportivo La Coruña e Valencia serem bem-sucedidos e o Real
Madrid conquistar a Europa. Vindo de um período marcado pela contratação de
muitas apostas infrutíferas – casos de Geovanni, Fábio
Rochemback, Juan Roman Riquelme e Javier Saviola, por exemplo –, o Barcelona precisava se
reestruturar e escolheu o holandês, que passara pela Seleção Holandesa e pelo Sparta Rotterdam, para a missão.
Com o treinador, chegou outra
figura crucial para a história Blaugrana:
Ronaldinho Gaúcho. Logo na primeira temporada, a dupla foi bem. A despeito de
um início ruim de temporada, com cinco derrotas e cinco empates nas primeiras
15 rodadas, o time se recuperou a tempo e ficou invicto entre as rodadas 19 e
35, terminando com o vice-campeonato, atrás de um forte Valencia. Naquele ano,
já era possível imaginar o que viria a seguir. Com boas atuações coletivas,
empolgantes performances de R10 – que marcou 19 gols em 39 jogos – e na
expectativa por novas contratações, o trabalho de Rijkaard dava sinais
prometedores.

Na sequência, aconteceu todo
aquele roteiro que a maior parte dos amantes do futebol muito bem conhece:
Barça bicampeão espanhol, campeão da UEFA Champions League e o time do melhor
jogador do mundo de 2005 e 2006, o mágico Ronaldinho Gaúcho. Há também outras
realizações que merecem ser reconhecidas: Samuel Eto’o e Deco mudaram de
patamar sob seu comando, assumindo enormes responsabilidades em um dos maiores
clubes do planeta; Xavi e Iniesta ganharam muito espaço no time e começaram a
mostrar o excepcional futebol que os consagraria sob o comando de Guardiola; e
Lionel Messi ganhou suas primeiras oportunidades.
Junto com seus jogadores,
Rijkaard tirou os Culés de uma
sequência de anos muito ruins e devolveu-os ao patamar que lhes é peculiar,
sempre na briga por títulos e mostrando bom futebol. Com Deco na armação das
jogadas, Ronaldinho, Eto’o e Ludovic Giuly infernizando as defesas adversárias,
o clube voltou a estar em alta. No entanto, suas duas últimas temporadas foram
vividas à sombra dos êxitos do Real Madrid e o treinador acabou deixando o Camp
Nou.
Houve desgaste e sua saída foi
inevitável. Todavia, seus méritos são grandiosos, com o treinador deixando a
Guardiola toda uma estrutura sólida para trabalhar e um clima muito mais calmo
do que o que encontrou quando assumiu o comando do time. Há época da saída do
holandês, o então presidente do clube catalão, Joan Laporta, revelou:

“Ele (Rijkaard) tem sido em todos
os momentos um treinador que demonstrou seu bom senso e dedicação ao clube, um exemplo,
nunca teve uma repreensão em relação a nada, nem seus jogadores, colaboradores,
nem para o clube, nem para nós que dirigimos o clube, o que é uma de suas
grandes virtudes”.

Assim, o treinador que extraiu o
melhor de Deco, Eto’o e R10, que lançou Messi e deu maiores chances a Xavi e
Iniesta partiu para o Galatasaray, após uma temporada longe dos campos.
Esperava-se que após seus anos na Catalunha sua carreira seguisse indo bem, com
bons clubes e resultados. Curiosamente, não foi o que ocorreu.
Na Turquia, o holandês ficou
apenas um ano. Mesmo com jogadores de qualidade em seu elenco, casos de Arda
Turan, Elano, Milan Baros, Harry Kewell e Mehmet Topal, o treinador não
conseguiu levar o time ao título. E mais: ainda ficou fora da UEFA Champions
League, vendo o surpreendente Bursaspor vencer a Liga Turca e o rival
Fenerbahçe ficar com o vice-campeonato. Tamanho insucesso, seguido por um
início apenas regular na temporada 2010-2011, levou o Galatasaray a trocá-lo
pelo romeno Gheorghe Hagi.

Em seguida, em meados de 2011,
Rijkaard aceitou comandar a Seleção da Arábia Saudita, mas durou pouco tempo, tendo sido eliminado nas eliminatórias para a Copa de 2014 e indo muito
mal na Copa do Golfo de 2013.

Leia mais: As curiosas carreiras de Ronald Koeman

Desde 2013, o ex-jogador é
embaixador e trabalha dando orientação ao desenvolvimento de jovens atletas na
Montverde Academy, um centro de estudos norte-americano que tem no esporte uma
de suas formas de estimular a aprendizagem, buscando provê-la de forma
diversificada. Curioso, não? Por fim, em 2014, Rijkaard anunciou que não tinha mais intenção de ser treinador.

“Não vou mais trabalhar como treinador. Não tenho a intenção de
trabalhar até os 60 anos, mas quero continuar a assistir e a conversar sobre
futebol. Estou muito agradecido por tudo que consegui, mas prefiro me dedicar a
outras coisas”
,
disse à revista Voetball.

Um treinador com passagem pela
Seleção Holandesa, com uma vitoriosa estada no Barcelona, além de outros
trabalhos, encontra-se hoje, aos 53 anos, afastado do futebol de alto
rendimento. Eis um cenário difícil de ser imaginado naquele ano de 2008, em que
o técnico e o Barcelona se despediram e que precedeu um período revolucionário
no futebol. Não há dúvidas de que Rijkaard foi um grande jogador em sua carreira e um exitoso treinador do Barça. Será
que ainda retorna ao futebol e às glórias?

Sem Resultados

  1. Filipy Bebeto disse:

    Que matéria boa! Rijkard soube explorar com perfeição aquilo que Van Gaal impulsionou. Lapidou muito bem os garotos Puyol, Xavi, Valdes e Iniesta. Foi um verdadeiro divisor de águas no Barcelona e impulsionou a revolução dos garotos de La Masia.

    Sou viciado em ler artigos de futebol e esse me chamou uma atenção especial, pois, de fato, é difícil entender como a carreira de alguém aparentemente tão sábio foi por água baixo dessa forma. O trabalho dele na Turquia foi um horror e de lá em diante foi só tristeza.

    Parabéns ao autor!

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