Estêvão, um craque em tempo real

BOM MESMO ERA O TEMPO DO ESTÊVÃO. AQUILO ERA FUTEBOL. Essa declaração lamurienta, vinda diretamente de um futuro não tão distante, tendo talvez saído da boca de um dos últimos Gen Z, terá sido uma das mais repetidas no contexto do esporte mais popular do planeta. Basta trocar o nome do Estêvão pelo de qualquer craque geracional que o Brasil teve o prazer de revelar ao mundo para comprovar a veracidade da afirmação. Não diga que nunca ouviu algo assim.

Estêvão Palmeiras
Foto: Imago/Arte: O Futebólogo

Por que retornar de uma viagem ao porvir para dizer do tempo de Estêvão? Para precaver os humanos sobre um apocalipse ludopédico? Ou, mais singelamente, como uma espécie de memento mori das quatro linhas? Antes da resposta, um detalhe: lá na frente já sabem que Estêvão foi um craque geracional, não adianta fingir que não, ele é um de tantos que se não tivesse nascido homem, teria nascido bola.

As coisas que o menino do Palmeiras faz, e é importante lembrar que se trata de um menino, não são novas. Seus dribles, a qualidade das finalizações, o entendimento de quando se deve encarar um marcador ou passar a bola, tudo isto, alguém já fez antes. Só que ainda causa espanto quando surge um novo expoente capaz de manter a roda girando, permitindo a continuidade do tempo. O passado viu, o presente vê, o futuro verá. 

Antes de Estêvão, houve craques geracionais. Durante Estêvão, há outros em desenvolvimento. Após, como a história ensina, haverá novos. Porém, a conversa de “bom mesmo era o tempo do fulano” não muda. Você ouviu. Seus pais e avós, também. Os filhos da sua geração provavelmente ouvirão. 

O que impede que o agora dê conta da grandeza daquilo que está acontecendo? Por que é tão difícil ver que a história é mais do que um futuro contando do que foi outrora um presente?

Michel Houellebecq, como citado pelo jornalista Ignacio Benedetti, na revista The Tactical Room, fez um alerta: 

“A nostalgia não é um sentimento estético, nem mesmo está ligada à recordação da felicidade, se sente nostalgia de um lugar simplesmente porque se viveu ali, pouco importa se bem ou mal. O passado sempre é bonito, e também o futuro, só o presente dói”.

O presente de Estêvão diz, com desânimo, que já em 2025 ele deixará o Brasil, rumando para o Chelsea. Questiona-se se não houve precipitação, se Londres será um bom destino e coisas afins. O presente de Estêvão projeta, com pouca esperança, como o Palmeiras fará para substituí-lo, ele que tem sido a diferença entre o sucesso e o fracasso do Alviverde Imponente em 2024, mesmo aos 17 anos.
 

Não é como se a todas as pessoas faltasse a sensibilidade para apreciar, atentas, a arte que Estêvão cria com seus pés, sobretudo com o esquerdo. Mas não é tão corriqueiro o reconhecimento de que, sim, se está diante da escrita da história. Lá no futuro, não informam com exatidão o que se passou com ele, por quais clubes atuou, quais títulos venceu, mas se garante: poucas vezes se viu tanto talento em uma pessoa só.

E ele está ali, no quintal, ao alcance da vista, desfilando um talento que é único, mas tem precedentes, sem pedir nada em troca. Alguém se lembra quem foi o último menor de idade a fazer oito gols e sete assistências em uma edição do Campeonato Brasileiro? Foi Neymar, em 2009. E, neste caso, ainda há muitas rodadas por jogar e a marca do santista pode ser superada.

Em breve, ele será Estêvão do Palmeiras e da Seleção Brasileira, outra questão que o posiciona ao lado de outros craques geracionais — a precocidade com que recebem seus primeiros chamados a representar a Canarinho. Ele é uma dessas raridades que pela mera presença em campo vale a pena parar para ver, torcendo ou não pelo Palmeiras.

Não é que não se deva lamentar a saída precoce de Estêvão para o futebol europeu, mas se trata de um fato incontornável e, até lá, o meia palmeirense ainda promete fazer muito estrago nas defesas adversárias, por aqui.

Quando for a hora de lembrar do tempo do palmeirense, e ela vai chegar, talvez não seja tão importante referir-se a ela em tom de lamento. O presente nunca passa tempo demais sem apresentar outro craque geracional. Por mais doloroso que seja, o agora é tudo o que se tem. Em 2024, ele responde pelo nome de Estêvão. Aproveitemos.

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