O último adeus do Nottingham Forest à Premier League

O que pode acontecer no curso de duas décadas? No cenário do futebol, um time pode deixar de ser habitual frequentador das divisões inferiores de seu país e chegar aos maiores pódios — como a História conta. Entretanto, pode viver também a situação oposta, deixando de encabeçar as disputas de elite e avançando à irrelevância. O Nottingham Forest oferece testemunho dos dois casos. Porém, é o último que se faz valer atualmente. Desde o fim de 1998-1999, o City Ground não recebe futebol de primeira divisão.

Manchester United 8-1 Nottingham Forest Premier League 1998-99
Foto: Press Association/Arte: O Futebólogo


Tragédia anunciada


O Campeonato Inglês de 1998-99 começou a se desenhar a partir do acesso de três equipes. Além do Forest, Middlesbrough e Charlton Athletic voltaram à elite. No caso do time de Nottingham, aquele era o segundo acesso da década. O primeiro havia sido consumado após o rebaixamento na edição inicial da Premier League, a da remodelação do certame em 1992-93 — no último ano do lendário treinador Brian Clough no comando do time. O homem responsável por transformar os Reds em algo mais do que um clube provinciano partiu para a aposentadoria, e o time fraquejou.

Apesar de ter dado resposta rápida, voltando ao primeiro escalão após apenas uma temporada, chegando até mesmo ao terceiro lugar em 1994-95, a lanterna de 1996-97 deixou claro que o clube estava entrando em um ciclo que seria difícil de abandonar. Nesse sentido, é válido o testemunho do holandês Pierre van Hooijdonk à revista Relvado: “Eu cheguei em março de 1997 ao Forest. O clube tinha oito pontos na Premier League. Todos sabiam que eles seriam rebaixados”.


Outra vez, alavancado por 29 gols do goleador holandês, o time retornou à Premier League, mas já não conseguia acompanhar as dinâmicas da época. “Minha lembrança desse tempo é de que a estrutura não era tão boa, o que ficou provado logo depois”, acrescentou Van Hooijdonk. Uma crise econômica sem precedentes estava chegando de forma avassaladora ao clube. O “logo depois” a que o atacante se refere ficou evidenciado entre 2001 e 2002. 


Em dezembro de 2001, o Seattle Times informaria que o Forest estava perdendo aproximadamente £105 mil por semana, sem que pudesse reagir. Já em 2002, o Independent noticiou a quebra da empresa do ramo de telecomunicações ITV Digital. Isso significou que os clubes da Football League — ou seja, das três divisões abaixo da principal — tiveram de arcar com um calote de £178,5 milhões. O periódico não poupou críticas ao grupo, indicando que aquilo se tratava de um “ato vergonhoso, uma traição ao jogo, um sacrifício das comunidades”.

Naquela altura, mesmo antes do final da temporada, o Forest se viu obrigado a demitir cinco funcionários de seu staff. Embora a bolha só tenha estourado no início dos anos 2000, ela já estava inflando desde a década de 1990, em que o clube já não encontrava os grandes negócios da transição dos anos 1970 para os 80, que o tornaram competitivo e famoso. Inclusive antes, em 1999, o time já havia sido condenado por fazer constantes pagamentos a jogadores e membros de comissão técnica por fora de seus contratos, no curso dos últimos vinte anos.

Desde então, já foi vendido duas vezes, uma para a família kuwaitiana Al-Hasawi e outra para o grego Evangelos Marinakis. Os sucessos esportivos nunca retornaram.

Queda livre


Pierre van Hooijdonk Kevin Campbell Nottingham Forest
Foto: Desconhecido/Arte: O Futebólogo
Embora um acesso costume trazer esperança, o de 1997-98 acabou logo revelando o contrário. Antes mesmo do início da disputa da Premier League, o clube perdeu três peças importantes. O vice-artilheiro da campanha da segundona (com 23 tentos) e parceiro de Pierre van Hooijdonk, Kevin Campbell, foi vendido aos turcos do Trabzonspor. Além dele, o lateral esquerdo Colin Cooper, que chegou a ser selecionável inglês, partiu para o Middlesbrough e Scot Gemmill foi afastado por se recusar a assinar um novo contrato. Uma série de contratações errantes ratificou o que viria a ser um fracasso retumbante.

Mas a campanha até não começou tão mal. Na estreia, o Nottingham foi derrotado pelo Arsenal, que seria o vice-campeão daquele ano. Na sequência, venceu Coventry City e Southampton. O problema foi que os vermelhos só retomaram o caminho dos êxitos na 23ª rodada, contra o Everton — depois de uma tenebrosa sequência de 12 derrotas e sete empates. Tudo para, na rodada seguinte, perder por um massacrante 8 a 1 para o Manchester United. Depois, os Reds venceriam o Wimbledon no 29º confronto, antes de terminar a disputa com o mínimo de honra, conquistando os nove pontos nas três rodadas fatais, ante Sheffield Wednesday, Blackburn e Leicester City. 

Absolutamente insuficiente, o Forest somou 30 pontos em 38 rodadas. Fechou a disputa com um saldo de gols de -34 e todos os piores índices possíveis: mais derrotas (22), menos vitórias (7), menos gols marcados (35) e mais tentos concedidos (69). E os problemas não foram apenas esses. 


Problemas, problemas e mais problemas


Diante do desmanche que viu acontecer às vésperas da competição, Van Hooijdonk pediu para ser negociado antes do início da temporada. A negativa lhe foi apresentada e ele, a quem havia sido prometida a possibilidade de uma transferência após o acesso, entrou em greve. “Por enquanto, continuarei treinando com o meu antigo clube, o NAC Breda. É necessário encontrar uma solução, caso contrário não voltarei”, chegou à dizer aos holandeses do Volkskrant. Ele só retornou em novembro, quando o time já estava afundado na zona de rebaixamento, e acabou sendo responsável por seis gols em 21 jogos.

Outra tentativa fracassada da equipe foi a busca de um novo treinador em janeiro de 1999, seguindo, fielmente, a cartilha do time rebaixado. Dave Bassett, o responsável pelo acesso, foi demitido e o time apostou na experiência de Ron Atkinson. O novo comandante nada pôde fazer para evitar o descenso e ao final da temporada anunciou sua aposentadoria.

Ron Atkinson Retires
Foto: Press Association/Arte: O Futebólogo
Pouco antes do fim da temporada, o clube ainda viveu outra turbulência com a mudança de mandatário. Nigel Wray, que assumira o clube em 1997, vendeu parte de sua participação a Eric Barnes, que assumiu o clube. À época, o jornalista Albert Scardino falou ao Independent sobre o que foram os anos sob a presidência de Nigel Wray: “O clube desperdiçou dois anos. Foi uma trágica perda de oportunidade para reconstruir um recurso da comunidade. Nigel Wray nunca se envolveu muito com o clube. Hoje ele está muito pior do que quando ele o comprou”.

Além disso, na parte final da temporada, Steve Stone, um dos melhores da equipe, que também tinha passagem pelos Three Lions e estava no Forest há uma década, foi outra pessoa a dar adeus ao clube, rumando para o Aston Villa. Com a consumação do rebaixamento, Van Hooijdonk também deixou a equipe, retornando à Holanda para representar o Vitesse. 

Em crise administrativa, com elenco enfraquecido, problemas com sua maior estrela e crescentes débitos a pagar, o Nottingham Forest pereceu. Não se pode dizer que o desfecho não era previsível. O que ainda não se imaginava era o quão baixo o clube chegaria. Já são mais de 20 os anos longe da Premier League, o que inclui a disputa por três campanhas consecutivas da League One, o terceiro escalão do futebol inglês. Para quem já reinou soberano pela Europa, o futuro segue incógnito, sendo o passado o tempo que traz alento ao coração dos fiéis torcedores do Forest.

Comentários

  1. Por favor, volta com o TIMES QUE GOSTAMOS.

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  2. lendo isso agora em 2022 com a possibilidade do forest voltar a elite seria emocionante

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