A vingança e a glória de Grabowski na Copa da UEFA de 1979-80

A Copa da UEFA, hoje Liga Europa, foi uma competição de clubes europeus de grande importância. Sucessora da Copa das Feiras, contava com algumas das melhores equipes do Velho Continente, na medida em que, à época, apenas os vencedores dos campeonatos nacionais disputavam a Copa dos Campeões. Nesse contexto, um dos times que despontou com considerável força foi o Borussia Mönchengladbach, ganhador de dois títulos na primeira década da competição (anos 70). No entanto, os Potros também perderam por duas vezes, uma delas com um tempero especial.

Eintracht Frankfurt Copa UEFA
Foto: Eintracht Frankfurt/ Arte: O Futebólogo

O Gladbach já não era o mesmo, e o Frankfurt…


Quando se desenhou a temporada 1979-80, o Gladbach ainda tinha um ótimo time. As razões para o otimismo eram evidentes demais para se negar: no meio-campo, um jovem, que sequer havia completado os 20 anos, revelava as credenciais de um jogador que seria lembrado para todo o sempre. Era Lothar Matthäus. Apesar disso, a geração vitoriosa do início da década se fora. 

Berti Vogts acabara de se aposentar, assumindo o comando da Seleção Alemã Sub-21. Günter Netzer também havia pendurado as chuteiras e trabalhava no Hamburgo. Já Jupp Heynckes igualmente deixara os gramados, mas seguia próximo a eles: dava os primeiros passos de uma carreira extremamente vitoriosos, treinando, justamente, os Potros. Além dos alemães, o craque dinamarquês Allan Simonsen acabara de ser vendido ao Barcelona.


Mesmo diferente, aquele era o time que defendia o título da Copa da UEFA, tendo vencido o Estrela Vermelha na final da temporada 1978-79. Também se tratava de um clube que ganhara quase tudo na década. Mal sabia que um longo jejum estava para se anunciar e que ele começaria com uma derrota para uma equipe tradicional, mas que carregava como seus grandes orgulhos apenas o título alemão de 1959 e o vice-campeonato europeu do ano seguinte.

O Eintracht Frankfurt, a despeito de não ser um dos clubes mais vitoriosos da Alemanha, vivia um ótimo momento. Na década de 70, terminara a Bundesliga no top five cinco vezes. Também vencera a Copa da Alemanha em duas ocasiões, em 1973-74 e 1974-75. Ademais, emplacara um grande nome na seleção germânica que disputou a Copa do Mundo de 1978, o ídolo Bernd Hölzenbein. As Águias poderiam não estar tão bem quanto os Potros, mas tinham os meios para tentar um voo bem alto.

A aposentadoria forçada de Jürgen Grabowski


Aquele elenco do Frankfurt teve de ter em mente um ponto importante: para muita gente, a disputa da Copa da UEFA podia ser a última. Em especial, seus grandes ídolos viviam seus respectivos cantos do cisne. Jürgen Grabowski, jogador de três Copas do Mundo (1966, 1970 e 1974), estava às vésperas de completar 36 anos, e ele, Hölzenbein, chegava aos 34.

Mas não eram apenas eles que já haviam entrado na fase final de suas carreiras. O zagueiro Willi Neuberger também se aproximava dos 34. Por sua vez, o volante Werner Lorrant estava com 31 anos, bem como o meia Bernd Nickel. É claro que, diante de tanta experiência, era necessária alguma juventude. Ela veio na figura de jogadores que tinham muito o que provar.

Jürgen Grabowski Bernd Hölzenbein
Foto: Eintracht Frankfurt/ Arte: O Futebólogo

No ataque, o primeiro sul-coreano a atuar na Alemanha tentava mostrar que o futebol asiático estava, lentamente, evoluindo: Cha Bum-Kun. No gol, um símbolo de resistência buscava ser mais intransponível do que a rigidez de um muro. O goleiro Jürgen Pahl havia fugido da Alemanha Oriental em 1976, durante uma competição de seleções de base, na Turquia.

Já no coração da defesa, Bruno Pezzey, um líbero austríaco talentoso com os pés, imperial pelo ar e conhecido pela maestria de seus desarmes, tentava superar os problemas de adaptação com que teve de lidar ao chegar à Alemanha.

Esse time não conseguiu lutar nas várias frentes que tinha. Acabaria a Bundesliga na nona posição, e, na Pokal, cairia nas oitavas de finais, perante o Stuttgart. Concentrou, pois, todos os seus esforços na Copa da UEFA. Apesar disso, teve de lidar com um evento inesperado e nada auspicioso.

Era disputada a 25ª rodada do Campeonato Alemão. O Frankfurt batia o Gladbach por 3 a 2, em um jogo apertado, quando Grabowski foi atingido por Matthäus. O veterano teve de deixar o campo, para onde nunca mais retornou. Sequer foi assinalada falta. Ainda assim, sem sua referência — jogador de uma só camisa e que havia disputado todas as partidas da temporada —, o time foi ao limite e golpeou os Potros mais duas vezes: o jogo acabou 5 a 2.

Desistir não era opção


A dor da perda, entretanto, não passou. Grabowski esteve em campo nas eliminações de Aberdeen, Dínamo Bucareste, Feyenoord, e em metade da disputa contra os tchecos do Zbrojovka Brno. Se as dificuldades com ele já seriam grandes, sem o craque, o esforço coletivo teria de ser ainda maior. E ele veio na forma de duas superações.

Nas semifinais, as Águias tiveram que eliminar o poderoso Bayern de Munique, que viria a ser campeão alemão naquela temporada. Parecia que o sonho acabaria já na primeira eliminatória. Dieter Hoeneß concluiu um cruzamento que veio da direita, balançando as redes de Pahl e, depois, Paul Breitner converteu uma penalidade máxima. Mas havia uma partida de volta e o compromisso com Grabowski não permitia desistências.

Bruno Pezzey Frankfurt
Foto: Desconhecido/ Arte: O Futebólogo
Era jogado o minuto 31 do segundo encontro, quando Pezzey diminuiu o prejuízo rubronegro. E foi ele quem ofereceu esperança ao torcedor novamente. As cortinas já estavam se fechando quando, aos 42 do segundo tempo, o líbero voou na bola que veio de um corner, para marcar o gol da igualdade. Derrota por dois a zero fora, vitória por dois a zero em casa, consequentemente, prorrogação.

No tempo extra, o reserva Harald Karger invadiu a área bávara e marcou o terceiro gol do Eintracht. Dois minutos depois, um balde de água fria ameaçou o triunfo das Águias. Wolfgang Dremmler arriscou de longe e contou com falha de Pahl, para colocar novamente o Bayern em vantagem. 


Contudo, aquela noite não poderia terminar com festa de outra torcida que não fosse a do Frankfurt. Ele foi à luta e marcou mais dois tentos, novamente com Karger e, por fim, em penalidade convertida por Lorrant. O time estava na final, contra o Gladbach.

Final feliz


O jogo de ida da final foi na casa dos Potros. Naquele dia 07 de maio, outra vez a batalha foi acirrada. As Águias saíram na frente, com Karger outra vez — agora de cabeça, após escanteio cobrado por Nickel. Mas a resposta veio rápido, menos de dez minutos depois. O capitão do Gladbach, Christian Kulik, acertou um petardo de perna esquerda. Ainda assim, aos 71, Hölzenbein concluiu, de peixinho um belo cruzamento da direita, colocando, outra vez, os visitantes em vantagem.

Então apareceu o carrasco. Cinco minutos mais tarde, Matthaüs, da entrada da área, desferiu outro chute preciso de canhota. E o pior aconteceu, já que Kulik, também de peixinho, deu a vitória aos Potros, quando o relógio registrava a iminente entrada no minuto derradeiro. Foi preciso juntar os cacos para o jogo final. Porém, havia o que comemorar: o time tinha marcado duas vezes fora de casa.


Em seus domínios, o Eintracht vivenciou um jogo muito mais tenso, cheio de erros de ambas as partes, e com menos oportunidades do que o primeiro. Parecia que o título ficaria com o Gladbach, impressão que ficou reforçada quando, cara a cara, Hölzenbein recebeu bola preciosa dentro da área rival e chutou em cima do goleiro Wolfgang Kneib. Mas o time precisava ganhar de qualquer jeito.

Então, o inesperado aconteceu. O reserva Fred Schaub, um jovem de 19 anos, estava em campo há quatro minutos, quando recebeu uma bola confusa na entrada da área do Gladbach. Aos trancos e barrancos, chegou ao solitário gol daquela final. Uma trajetória marcada por dor e superação terminou com sorte de campeão. 


Após o jogo, ficou claro o que aquela final significou. Grabowski apareceu, foi ovacionado por seu torcedor e carregado pelos companheiros. Tratado como lenda, enquanto Matthaüs descia aos vestiários, derrotado. Hölzenbein levantou a taça, mas logo a entregou a quem ela melhor cabia. Consagrado, Grabowski deixou, por fim, o Waldstadion. Já Matthäus permaneceu, para sempre, persona no grata no clube, que anos depois, em 2001, veria seu torcedor se revoltar diante da hipótese de tê-lo como treinador.

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