Os altos e baixos da carreira de Igor Belanov
O mais tradicional prêmio individual da história do futebol é, indiscutivelmente, o Ballon d’Or, láurea oferecida pela
revista France Football. Originalmente entregue apenas a jogadores europeus, foi
recebido por três diferentes mãos soviéticas em sua história. Duas dessas são
constantemente reverenciadas: Lev Yashin e Oleh Blokhin. No entanto, o terceiro
elemento não goza desse mesmo estatuto. Saindo de baixo e terminando a carreira no ostracismo, Igor Belanov viveu também um período de brilho intenso, em uma carreira de muitas reviravoltas.
De origem ucraniana, mas representante da União Soviética, Belanov começou sua carreira na cidade de Odessa, banhada pelo Mar Negro. Defendendo as cores do modesto SKA Odessa, clube cuja maior glória é um título da copa que precedeu a Copa da Ucrânia, ganhou rápido destaque local e passou a representar o Chornomorets, maior clube da região. Vivia-se, então, a transição entre os anos 70 e 80.
A partir de então, passou a
disputar a Soviet Top League, mas sem qualquer chance de título. Os campeonatos que disputou pelo clube tiveram como vencedores Dynamo Kyiv, Dinamo
Minsk, Dnipro e Zenit. No entanto, em 1984, o Chornomorets terminou o ano em
quarto lugar, seis pontos distante do campeão, apenas. Igor chamou atenção e, como é
praxe na Ucrânia, foi observado e contratado pelo Dynamo Kyiv, que havia trazido de volta o
icônico treinador Valeriy Lobanovskyi. Iniciava-se, ali, o segundo de três atos vitoriosos do treinador no comando kievano e Belanov seria parte importante do
processo.
Atuando ao lado do já veterano,
mas não menos excepcional, Blokhin, brilhou. Meia-atacante de virtudes
atléticas destacadas e capacidade de finalização privilegiada, rapidamente começou a somar grandes atuações. Em sua primeira Soviet Top League com o Dynamo, em 1985, foi
o vice-artilheiro do clube, com 10 tentos em 31 jogos. De quebra, levou para casa seus
primeiros troféus, conquistando campeonato e copa soviéticos. Não obstante, não
foram essas conquistas que começaram a construir a reputação internacional do
craque.
O título da Soviet Cup carimbou o
passaporte do Dynamo Kyiv para a disputa da UEFA Cup Winners’ Cup de 1985/86.
Já tendo conquistado o certame disputado em 1974/75, os ucranianos (e,
especialmente, Blokhin e Lobanovskyi, dois remanescentes) buscavam o
bicampeonato. Assim, depois de passar por Utrecht, Universitatea Craiova, Rapid
Wien e Dukla Prague, chegaram a final, que seria disputada em Lyon e teria o
Atlético de Madrid como adversário.
Comandado por Luis Aragonés, o
time espanhol apostava muitas de suas fichas na figura do atacante uruguaio
Jorge da Silva. Todavia, os Colchoneros
não foram páreo para o poderio técnico-físico-tático do Dynamo, que impôs três
bolas a zero no score daquela noite.
Belanov foi, ao lado de Blokhin, Oleksandr Zavarov e Frank Lippmann (do Dynamo
Dresden), um dos artilheiros do torneio, com cinco gols anotados. Não é difícil
concluir, ademais, que nesse período o odessense chegou à Seleção da URSS e
disputou a Copa do Mundo de 1986.
No México, viveu muitas emoções.
Tendo enfrentado França, Hungria e Canadá no Grupo C do Mundial, os soviéticos
avançaram em boa forma, assegurando o primeiro lugar. A despeito disso e
contra a maioria dos prognósticos, a URSS pereceu diante da boa geração
belga de então, cuja base era formada por atletas do competente time do
Anderlecht. Porém, não sem uma dose adicional de tristeza para Belanov, autor
de um hat-trick na partida que terminou
4x3 para os Rode Duivels, na
prorrogação.
Campeão europeu com o Dynamo e autor de quatro gols na Copa do
Mundo, Belanov passou a ser tido em alta conta e, naquele que se confirmou o
ano de Diego Maradona, foi eleito o Ballon
d’Or de 1986, uma vez que não eram admitidos jogadores de outros
continentes, ainda que atuassem na Europa. Bateu Gary Lineker e Emilio
Butragueño. Escolha surpreende a parte, o prêmio coroou o especial momento do jogador.
Sua trajetória seguiu sendo
exitosa com a camisa do clube kievano. À sua estante, Belanov adicionou o
título soviético de 86 e a Soviet Cup de 87. No entanto, viveu outro ponto
baixo em sua carreira. Importante selecionável, disputou a Euro de 1988.
Líder do Grupo 2 da competição,
batendo Holanda e Inglaterra e empatando com a Irlanda, a URSS avançou às
semifinais e eliminou a Itália, que apostava muitas de suas fichas na dupla da
Sampdoria, formada por Roberto Mancini e Gianluca Vialli; chegou à final, o que
não acontecia desde 1972. Novamente, teve de confrontar a Holanda, naquele que
se tornou um jogo inesquecível.
De um lado, o icônico Rinus
Michels comandava o talento de Frank Rijkaard, Ruud Gullit e Marco van Basten; do
outro, Lobanovskyi, de volta ao comando soviético, alinhava Belanov e o
goleiro Rinat Dasaev. Dessa vez, a Oranje
venceu, van Basten marcou um dos gols mais fantásticos de todos os tempos a mais
um conto do ludopédio foi escrito. Entretanto, esquece-se, muitas vezes, um
trecho dessa história: Belanov colocou uma bola na trave do goleiro Hans van
Breukelen e, pior, desperdiçou uma penalidade máxima. Sua carreira ainda daria
outra reviravolta.
Depois de flertar com o Osasuna,
o atacante fechou contrato com o Borussia Mönchengladbach, em 1989; custou o
equivalente a 132 milhões de pesetas, conforme noticiou o jornal El País. Era ainda um atleta bem cotado: três anos antes havia sido eleito o melhor jogador da Europa, conquistara
títulos com seu clube e fora finalista da Euro de 1988. Sucesso garantido? Não
mesmo. Belanov não foi sombra de seu melhor na Alemanha. O jornalista Ian
Farrell, na revista inglesa When Saturday Comes, escreveu que o soviético se
mostrou “despreparado para a vida no oeste e sem o comando de Lobanovskyi”.
No novo país, pouco jogou e,
consequentemente, quase não marcou gols. Mas não foi só isso: em 1991, teve seu
contrato rescindido, após sua esposa ter se envolvido em furto a uma loja. Do
Gladbach, passou ao Eintracht Braunschweig, clube em que disputou a segunda e a
terceira divisões germânicas. Ainda retornou brevemente ao Chornomorets e
encerrou a carreira, melancolicamente, no Metalurg.
Lembrado por muitos como o maior outsider a vencer o Ballon d’Or em toda a história do prêmio, Igor Belanov foi um
grande jogador, mas acima de tudo protagonizou uma carreira com altos representativos
e baixos igualmente impactantes. É mais um personagem cuja memória não
se separa da história da URSS. O sucesso individual baseado na coesão coletiva
do Dynamo Kyiv, o fato de ter sido um expoente das virtudes soviéticas e a
saída tardia e malsucedida para a Alemanha só reiteram que a carreira de
Belanov carrega junto a si muito mais elementos do que a simplesmente a trajetória de um futebolista.
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